domingo, novembro 26, 2006

Algarve , como o sinto

Falam-me de alguns locais no Algarve e até me arrepio.
É que eu vivi grande parte das minhas férias de criança e adolescente precisamente no Algarve , mas não o que agora conhecemos . Um Algarve castiço , onde realmente se difrustava da praia , do mar , da terra , das pessoas. Um Algarve de pescadores com barco de madeira , gente com quem comiámos à mesa , depois de uma tarde inteira no mar. Um Algarve de tasquinhas junto ao mar e meia dúzia de casas de praia à volta.
O alojamento dos turistas , portugueses ou estrangeiros , fazia-se através de aluguer de casas ou nos poucos hoteis que existiam na altura e que ainda hoje existem ( embora muito decadentes e sem perspectiva de serem recuperados , pelo menos a grande maioria ) , embora grande parte dos turistas ficassem instalados nos parques de campismo.
E como eu tenho saudades do campismo ( apesar das bichas para o telefone , para o banho quente , para o supermercado , sobretudo após o 25 de Abril ) ! As férias na altura não eram tão breves quanto isso . As férias escolares duravam cerca de três meses , mas as dos pais no máximo um mês , o que signicava que o tempo no campismo seria de cerca de três semanas , no máximo. E nessa altura , em três semanas, convivia mais do que hoje num ano inteiro ou até vários anos inteiros seguidos. As pessoas estavam umas com as outras sem receios ; fossem gregos , troainos , judeus , cristãos , pretos , brancos , velhos , novos... as pessoas sabiam viver e sem que a privacidade de cada um estivesse ameaçada. Tenho também saudades dessa entrega , desse tu cá tu lá amigável e respeitoso , da troca de ideias e experiências. É que hoje faço férias aqui e acolá e sou capaz de estar uma semana no mesmo local sem conhecer ninguém. É que cada um vive fechado sobre si mesmo , tipo concha e eu não sei lidar com isso. Além disso , se tento uma abordagem mais pessoal , directa , olham para mim como se fosse um alien.

Hoje em dia o Algarve , de uma forma geral , está ameaçado.
Há terras que se transformaram em dormitórios piores que alguns da linha de Sintra. Há praias quase sem areal .
Há mar que é simplesmente esgoto.
Os barcos deixaram de ser de madeira para serem de fibra e até os pescadores estão limitados a pescar no seu mar de sempre.
As tascas com o seu belo peixe grelhado à vista de todos , já quase não existem , tendo sido substituídas por restaurantes presunçosos que até camarão estragado vendem , para além de que a ementa passou a ser escrita em inglês ou alemão.
Os campos de amendoeiras ou alfarrobas que davam aquele cheirinho tão
especial ao Algarve , são agora aglomerados de cimento sem qualquer espaço verde à volta , que mais parecem jaulas ou até mesmo prisões.
A loja do mestre André ou do mestre Zé ou de qualquer outro mestre deu lugar aos Shoppings e mais recentemente aos Foruns Comerciais.
Aqueles bares onde até se fumavam umas valentes ganzas , mas onde se ouvia boa música e de onde se saia para ir comprar o pão quente e ver nascer o sol sobre a praia , são agora discotecas com um som violento o qual só se aguenta pastilhado , acabando a noite no lado errado da mesma.
Para o Algarve ( volto a dizer de uma forma geral ) só vai gente endinheirada e sem gosto nenhum ou gente com uma vida medíocre durante todo o ano à procura de diversão fácil.
Felizmente ainda há uma ou outra excepção à regra ; alguns locais entre Tavira e Vila Real de Santo António , alguns locais entre Lagos e Sagres e as ilhas da Fuzeta ( onde cheguei a estar de férias com os meus amigos da música popular portuguesa, chegando mesmo a conhecer o Zeca ), Armona , Tavira ... e o interior que só gente sábia tem sabido explorar ( que assim continue a ser ).

O fim de semana passado fui trabalhar para o Algarve e sempre que ouço falar na Praia da Rocha até estremeço. É que é daqueles lugares irreconheciveis no verão. Desta vez , fui no Outono e fui surpreendida. Consegui disfrutar um pouco da Praia da Rocha de outros tempos... ou do pouco que resta dela.




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