Os primeiros concertos

Eu era uma criança muito pacata. Tão pacata, que num relatório do jardim infantil, sobre o meu comportamento no recreio, constava : passeia-se. Tão pacata, que um dos prémios anuais da escola, foi o da calma.
( não sou eu, definitivamente não devo ser eu ).
Perante a minha forma de estar contemplativa, a minha mãe deve ter ficado preocupada e atirou-me para a vida.
Levava-me com muita frequência ao cinema ( adorava ir ao Monumental na altura do Carnaval ), ao teatro, ao circo e a outros acontecimentos únicos na época, como ir ver a Pipi das Meias Altas ( a actriz , é claro ) a patinar no Jardim Zoológico, a uma sessão de autógrafos da Pandilla ( a formação espanhola ) numa loja de discos na Rua da Beneficência ... eu estava sempre em todas.
Depois começaram os concertos e lembro-me de perder alguns importantes ( Police no Restelo e The Shirts em Lagos ).
O primeiro concerto, a sério, a que assisti, fui acompanhada pelos meus pais e o meu irmão Miguel.
Foi em Lagos - cidade onde passávamos férias todos os anos, no Parque de Campismo da Trindade do Clube de Futebol Esperança de Lagos ( era um luxo tomar banho no balnerário dos jogadores, levar injecções de penicilina do médico do clube e ter o Ti Xico como amigo) - mais precisamente no Parque das Freiras ( actual Auditório Municipal de Lagos ), ao ar livre .
As bandas eram :
Petrus Castrus ( banda de Pedro Castro que entretanto formou uma empresa de som , a Hipersom , que entretanto também já não existe ), Rui Veloso ( sem querer errar, julgo que também foi o seu primeiro concerto ), Gang of Four e, por fim, Steve Harley.



Os espectáculos seguintes, de bandas bem mais interessantes, foram no Pavilhão do Dramático de Cascais e sempre na companhia da minha mãe, que tinha pachorra para se meter no comboio, apinhado de gente que não pagava bilhete, chegar a Cascais e seguir em fila indiana até ao pavilhão e já no recinto estar numa fila interminável para entrar.
Depois do concerto e quando se perdia o comboio , dormia-se na praia à espera do primeiro comboio para Lisboa e a minha mãe alinhava !
Mas todo este ritual era um pretexto para as pessoas se conhecerem umas às outras, fossem elas novas, velhas, brancas, de cor, rockeiras, punks, motards, betinhos, não interessava.
Todos iam para curtir o concerto e o mais que viagem proporcionasse.
O meu primeiro concerto no Dramático de Cascais foi PETER GABRIEL , com SIMPLE MINDS na 1ª parte ( na altura ninguém os conhecia e foram muito apupados ).
Peter Gabriel e os músicos entraram em palco vindos da plateia, trazendo uma luz na mão ( não sei se seria uma grande lanterna, se um projector ).
O espectáculo era muito inovador para aquele inicio de década : com uma mini pista de dança com luzes no chão ( tipo a do “Saturday Night Fever” ) e os fatos dos músicos, tipo espaciais, também com luzinhas florescentes.
“Games without frontiers “ era o hit.
Foi uma noite que ainda trago comigo.



Uns meses mais tarde, começaram os espectáculos mais “pesados” – os CLASH e os RAMONES - duas bandas que estavam sempre a tocar no gira-discos lá de casa ( ai que saudades do vinil ... ).




Mas o meu primeiro concerto no Coliseu, acho que foram os FISHER Z, Tour 80, mas salvo erro em Novembro de 81 ( pois foi posterior à sua passagem pela Febre de Sábado de Manhã no Estádio de Alvalade ), actuando na 1ª parte um solista de música country.
Plateia em pé, ao rubro. O chão do Coliseu a baloiçar.
Foi também o primeiro concerto sem a companhia da minha mãe, mas que só foi possível com a sua preciosa ajuda e do seu amigo, o “velho” Covões .



Muitos outros se seguiram , com muitas aventuras pelo meio.
E o “bichinho” da música instalou-se.
Mãe, mal imaginavas tu o que tinhas arranjado :)