quinta-feira, fevereiro 02, 2006

Manila ( Filipinas , 10 a 14 de Dezembro 1999 )

Filipinas – a primeira imagem que nos vem à cabeça , é uma praia paradisíaca , de águas limpidas, o verdadeiro chamariz para umas férias merecidas. Pois é, se falarmos das imensas ilhas que constituem o País, esses pequenos e cada vez mais raros paraísos ( destruídos pelos resorts que são iguais nas Filipinas, na Tailândia, em Cuba, em Cabo Verde ou no Brasil ) são uma ínfima parte do que hoje em dia são as Filipinas.
Também não serei a pessoa indicada para falar sobre o País ( primeiro uma colónia espanhola e depois um "abrigo" americano prolongado ), mas sobre os dias que passei em Manila , em Dezembro de 1999 , apetece-me contar :

Aproveitando uma deslocação a Macau, em trabalho, por altura da cerimónia de transferência de Macau para a China, resolvi antecipar a viagem uns dias e fazer um desvio em Hong Kong para Manila, uma vez que seria uma das poucas oportunidades de visitar o meu sobrinho Gonçalo que ainda hoje aí vive.
O Luis foi comigo.
Chegámos a Manila, já de noite, depois de um voo de cerca de 3 horas completamente cheio ( já tínhamos feito cerca de 15 horas Lisboa – Frankfurt – Hong Kong ).
No aeroporto, cartazes bem visiveis com a inscrição de que no País existe pena de morte para portadores de droga ( OK, cuidado com as malas e com os bolsos ). De repente, um apagão ( provocado pela acumulação de alforrecas no sistema eléctrico da cidade que durou mais de 12 horas ), mas logo foi restabelecida a energia, no aeroporto,através de um gerador. Mas as malas nunca mais apareciam no tapete... mais de duas horas passaram e rolaram pelo tapete bagagens de todo o tipo , sobretudo enormes caixotes repletos de produtos variados, mas todos iguais, desde chapeús de chuva, a ursos de peluche, a massas chinesas de pacote ( certamente para armazéns de lojas dos 300, pensei eu ).
Finalmente as nossas malas e um abraço, com saudade, do Gonçalo.
A caminho de casa ( um condominio privado, bem policiado, a cerca de 15km do centro da cidade ), uma imensa escuridão e um trânsito caótico ( passando por estradas de terra batida e sem semáforos ). Foi o tempo de pôr um pouco a conversa em dia, de experimentar os pasteis de nata das lojas “Coeur de France “ do Gonçalo e de tomar conhecimento daquela que seria a primeira curiosidade desta viagem : A emigração é o “produto” de maior exportação das Filipinas . Connosco, de Hong Kong, viajavam apenas emigrantes que iam passar o Natal a casa, sendo sua obrigação trazer para todos os seus vizinhos do bairro uma prenda. Por isso todos aqueles pacotes sem fim...
O dia seguinte foi essencialmente aproveitado para descansar, estar com a familia e combinar um passeio pelo rio onde foi filmado parte do filme “Apocalipse Now “. Mas, a meio da noite, fomos surpreendidos por um tremor de terra que me deixou em pânico, controlado é claro. A cama onde estava deitada parecia estar a navegar sobre um mar alegremente ondulado. O mais estranho de tudo foi que, em casa ( onde dormiam pelo menos mais 6 pessoas ), ninguém se levantou, os animais não reagiram, tudo parecia normal. Pelos vistos o abalo não foi assim tão forte e os residentes já se habituaram a estas ligeiras perturbações da terra. Eu é que não achei piada nenhuma até porque o passeio ia sendo cancelado.
Mas o passeio não foi cancelado e lá fomos nós ( Gonçalo , Luis e eu ) subir o tal rio ( cujo nome não me recordo ), só até meio, porque as águas ficaram muito agitadas pelo acontecimento ocorrido na noite anterior ( o que foi uma pena, pois, ao que parece, no cimo do rio existe uma cascata enorme, fantástica para umas boas banhocas ). Toda a envolvente do rio é muito bonita, mas na verdade é um lamaçal sem fim. A viagem faz-se de canoa, puxada por dois homens descalços, magros, de tez escura marcada pelo sol, olhos rasgados, nariz achatado e é um convite à aventura. Adorei este local, onde acabámos por almoçar e provar comida filipina que é completamente incaracteristica e muito má ( o que valeu é que todas as outras refeições foram em casa ou em óptimos restaurantes de comida japonesa, chinesa e mongol ).









De volta a Manila percorremos caminhos cujas margens são acompanhadas por extensos e magnificos campos de arroz e cada aldeia que se passava era identificada por construções muito bonitas da era colonial espanhola ( a de nome mais original era PILA ).



E tratando-se de uma viagem relâmpago , chegou o último dia .
O Gonçalo disponibilizou um funcionário ( o Ruben , mais conhecido por Buddy ) para nos levar a visitar INTRAMUROS , o centro histórico de Manila, nomeadamente a catedral, o Forte de Santiago e arredores e ainda um bairro muito interessante da cidade, o bairro chinês, o de maior densidade populacional : DIVISÓRIA. Aqui vivem para cima de 10 milhões de habitantes e é também nesta zona que se encontra o grande mercado da cidade e um número de lojas interminável, onde sem dúvida é tudo mais barato. Mas o que mais me marcou foi o cheiro . O cheiro de ali se fazer de tudo, misturado com os aromas das frutas e dos fritos das tendinhas. E o que foi deveras inacreditável, foi não conseguir passar da zona periférica do mercado – ao tentarmos entrar no coração da Divisória simplesmente não conseguímos sequer por os pés no chão da rua. Era um turbilhão de gente a atropelar-se, de “mosquitos”, de comida espalhada pelo chão, que rapidamente nos fez desistir e seguir caminho para a zona financeira da cidade – MAKATI - onde se encontram os grandes bancos, os grandes hoteis, as grandes multinacionais, os grandes shoppings e onde nessa noite o Gonçalo e a Ana ( minha homónima, com o mesmo nome no cartão de crédito, o que suscitou a admiração de muitos logistas, pois ela é oriental e eu ocidental ) haviam organizado um jantar de Natal com todos os funcionários das suas lojas, seguido de entrega de diplomas e da actuação de uma banda de covers que actuou noite adentro.
Até nessa festa fui surpreendida ... todos os jovens tinham mochilas e de duas em duas horas entravam nas casas de banho, saindo de lá com uma nova indumentária, novos penteados, novas maquilhagens... afinal parece ser um costume!
E assim foi esta primeira incursão por este lado do Mundo ( sim , porque uns anos mais tarde ainda lá voltei :/ ).








Apontamentos

Manila é gente por todo o lado, as diferenças sociais são brutais, o catolicismo é fanático ( ainda se fazem cerimónias de crucificação por altura da Páscoa ), as pessoas só querem festa ( mais concretamente karaoke ), os cabos eléctricos são um emaranhado de fios sempre por fora dos edificios, o legado histórico é espanhol, o que não interessa é americanização.
É um verdadeiro caos, que pelo meio tem ilhas de civilização, mais ao estilo americano e não propriamente “hi tech”.
Os veículos locais, os jeepneys ( carros de metal ) e os “mosquitos” ( motorizadas também de metal e quase sempre de 2 lugares ), coloridos, portadores de mensagens religiosas, muito tipicos e muito poluentes, dão uma vida especial à cidade ( a contrastar com os carros de luxo, com cama, DVD ou ainda os helicópteros particulares ).
O ar não é respirável e por isso se vê tanta gente com máscaras pelas ruas.
As águas dos rios e do mar que envolvem a cidade são castanhas, estão cheias de lixo e cheiram a podre.
No entanto, é uma cidade cheia de alma e de espirito muito “caliente” . As gentes de tez escura e olhos rasgados fazem lembrar o semblante do povo mexicano ( viagens entre Filipinas e América do Sul ? ).
No que respeita à língua ... existem diversos idiomas locais ligados a credos e posição social. No entanto, pareceu-me que a língua mais falada é o inglês filipino ( ou o que isso poderá querer dizer ). Apesar da maioria da população ter nomes e apelidos espanhois, o castelhano parece ter-se perdido durante a presença americana no País.
Por fim, o mais bizarro, é que as gentes de Manila parecem não ter referências próprias,cultura própria. Fugiram para a grande cidade das oportunidades e, apenas, sobrevivem. Mesmo assim, o seu olhar ainda brilha .
Longe de ser o tal local paradisíaco , Manila é um mundo de sensações e marcou-me, positivamente.





1 comentário:

♥ k disse...

Que viagem deliciosa me ofereceste! =)

Besitos ********** k