quinta-feira, outubro 09, 2008

Entranhei o Pico :/

Eu sempre disse que um dia haveria de subir a montanha do Pico e sempre manifestei desejo de o fazer , embora na realidade fosse mais simples deitar tais palavras da boca para fora do que passar à acção ( até porque nunca acreditei que o conseguisse fazer ) . Sempre tive como desculpa o facto do Mário não poder subir a montanha e eu ter que ficar com ele.

Mas este ano tudo se conjugou de forma a eu finalmente subir o Pico ! Tinha a companhia da minha mãe e o Roberto ( da Abegoaria ) que se disponibilizou para organizar tudo , de maneira a que não houvesse hípotese de eu passar mais uma vez por aquela ilha , sem cumprir o meu velho sonho.

Pensava eu que o assunto estava esquecido quando , de repente , o Roberto me confronta com tudo planeado para a subida ao Pico . Arranjou um guia , o Manuel , para me acompanhar e à minha mãe , em vez de irmos num grupo grande que poderia exigir um ritmo diferente para o qual não estivéssemos preparadas e planeou uma série de actividades , para com a ajuda do Norberto , praticarem com o Mário: observação de pássaros , andar de burro , dar de comer às cabras , pescar à cana , estar na piscina das furnas em S.Roque , enfim... passar o dia no meio dos homens.

Hesitei e estive quase a desistir. Não me sentia mínimamente preparada para tal aventura e para deixar o meu menino ( tive medo que não me voltasse a ver , vá-se lá saber porquê ). Para além disso , sentia em mim que devia era continuar a contemplar o Pico como até então. Mas o imenso entusiasmo da minha mãe e a eventualidade de não poder ter outra oportunidade de subir ao Pico , bem como a felicidade do Mário por estar um dia fora das saias das mulheres, deu-me força para encarar o desafio.

Assim , na manhã de 18 de Setembro , madrugámos e às 8h estávamos no parque de campismo das Furnas ( em S.Roque ). Deixámos o Mário com o Roberto e o Noberto e seguimos de carro , com o Manuel , até à nova casa de apoio da montanha ( inaugurada recentemente , não estando ainda a funcionar em pleno ) , ponto de partida para a caminhada.

A casa da montanha foi criada para dar apoio a todos aqueles que resolvem aventurar-se montanha acima e abaixo , de forma a evitar acidentes ( alguns fatais ) como já aconteceram. O pessoal de apoio pertence a agrupamentos de bombeiros e antes da escalada é feita uma inscrição com o horário de saída e com o horário previsto para a chegada , sendo ainda facultado o número de contacto ( isto para quem tiver telemóvel ou bip). Desta maneira é mais fácil perceber se alguém poderá estar a precisar de auxílio.

Grande parte dos que sobem a montanha são pessoas já muito habituadas a escaladas e vêm todas bem equipadas ( ninguém usa ténis All Star , como eu ! ). Em média , chegar ao Pico do Pico demora cerca de 3 horas e a descida até à casa de apoio cerca de 2 horas. Mas tratando-se da minha pessoa tais previsões foram logo postas de parte...

Partimos às 8.45h ( com previsão de chegada às 18h ) , começando por subir as escadas que nos levaram a um anjo ( escultura ) e a partir daí a caminhada fez-se sobre pedra , muita pedra e pouca terra ( quais trilhos direitinhos, qual quê ).

A primeira étapa é demarcada pela furna . Após 900m , que me deixaram derreada ( quase não conseguia respirar ) lá cheguei ... A minha mãe e o Manuel estavam frescos que nem uma alface e com um ritmo bem diferente do meu ( e eu sem pedalada para aquilo ). Resolvi desistir e deixá-los seguir caminho. Ficou combinado que eu não desceria a montanha sózinha e que caso conseguisse subi-la um pouco mais ( ficou logo posta de parte a possibilidade de eu conseguir alcançar o topo ) , que aguardaria nalgum dos marcos ( dos que ainda restam) por eles , quando descessem.

Não me apeteceu esperar o dia todo e de uma forma muito poética e contemplativa lá fui chegando a este e àquele marco, passando por mim alguns grupos de verdadeiros montanheiros que não manifestavam qualquer tipo de cansaço. E... cheguei aos 1700m!Nem sei bem como ! Por aí fiquei algum tempo , tendo comido uma pêra que me soube pela vida e bebido bastante água. E fui ficando... olhava para cima e só conseguia avistar uma subida muito íngreme. Como iria prosseguir caminho ? Aquilo era uma loucura ! E voltei a desistir, apesar de ter imensa vontade de avistar o Pico. É que já tinha andado aquilo tudo e ... Pico , nada ! Resolvi esperar de novo pelo encontro com a minha mãe e o Manuel, até que chegou àquele lugar um grupo conduzido por um guia , que por ali ficou a alimentar-se e a descansar por breves momentos. O guia depois de saber que tinha deixado “a minha gente” prosseguir caminho sem mim , convidou-me a continuar viagem com eles e eu aceitei , sempre salvaguardando que iria até onde pudesse.

Assim , lá consegui subir aquilo que nunca maginei ser possível , até à étapa seguinte , os 2050m. E fi-lo porque o Milton , o guia , é muito mais que um guia. É um companheiro de montanha e sabe como incentivar o seu grupo ,mesmo que alguns tenham um ritmo mais lento que outros ( era o meu caso e o de uma senhora alemã ). Mas continuava a não vislumbrar o Pico, mas com a certeza de que ele seria visível. Mas quando ? Saber controlar esta ansiedade é o segredo de um bom guia e o Milton era-o sem dúvida alguma.

Depois dos 2050m a subida continou a pique , mas já com a promessa de que depois disso ,o caminho voltava a melhorar. Mas por essa altura eu já não estava a conseguir acompanhar nem este grupo , mas não queria dar parte fraca... e eis que encontro a minha mãe com um sorriso de orelha a orelha e a exclamar “olha a minha Ana ! “ . Estava toda feliz por eu ter conseguido continuar viagem ,mas sobretudo porque a safada já tinha estado na cratera e no topo do Pico, com todo o Atlântico “aos seus pés” , assim como todas as ilhas do grupo central! Fê-lo em 3 horas e já todos diziam que ela dava uma excelente guia de montanha :) ( não fosse a maldita osteoporose , acho que era uma hípotese a considerar ).

Eu estava exausta e tive de deixar o grupo continuar sem mim .Pedi à minha mãe e ao Manuel para voltarem a subir comigo , mas com muita paciência. E quando já avistava as Lages e a pouco menos de 200m da cratera ( cada passo que dava equivalia a uns 10km ) , a respiração começou a ficar deveras difícil e a ansiedade a instalar-se . A minha mãe voltou a desaparecer, mas desta vez o Manuel ficou comigo E eu só resmungava , muito irritada , porque já não acreditava que dali a tão pouco iria avistar o Pico. E sempre que me levantava e dava um passo, voltava a sentar-me. Com muito sacrifício ( meu e do Manuel ) cheguei à cratera e lá estava a minha mãe ( com o cansaço a manifestar-se ) à minha espera. Assim que cheguei à cratera e consegui ,por fim, ver o Pico , as minhas pernas prenderam-me ao chão e fui incapaz de dar mais um passo. Fiquei por ali e ainda havia que voltar a descer tudo !

Demorei 5 horas a chegar à cratera , mas cheguei. É incrível fazer este percurso , pois a montanha não se sobe a direito . A subida inicia-se do lado do Faial e o Pico é contornado , sendo dada quase uma volta de 180º , pois quando se chega à cratera já estamos do lado das Lages e avista-se o topo de São Jorge. E só aqui é que podemos ver o piquinho do Pico !

Quanto ao piquinho , continuo a namoriscá-lo :) Do grupo com quem fiz parte do caminho , todos o subiram, excepto a tal senhora alemã , que mesmo assim foi mais corajosa que eu, pois ainda se passeou pela cratera.

Não esperámos muito tempo para iniciar a descida e o relato desta é interdito. Só adianto que perdi a cerimónia , que o Manuel foi um mártir e que o stress ainda existente dentro de mim foi todo expulso , mas esta foi a única forma de conseguir descer tudo aquilo que tinha subido, embora teimasse em afirmar que era impossível tê-lo feito ! Já me tinham dito que a descida do Pico é mais difícil que a subida , mas os ouvidos, por vezes , parecem moucos...

A minha mãe acabou por fazer a descida também com bastante dificuldade , mas com muito mais agilidade do que eu e mais uma vez adiantou-se bastante , pois se parasse não conseguiria continuar a andar.

Chegámos à casa de apoio pelas 18.15h ( os ténis foram imediatamente substituídos por chinelos e não resisti a fumar o primeiro cigarro do dia ) e eu estava certa de uma coisa : não voltaria a subir a montanha. “O Pico é para se contemplar e não para se desafiar . Nunca mais me apanham numa destas. Que estúpida que fui ! Porque raio me pus a subir isto tudo? “.

Só tretas ! Passado pouco mais de um mês , cada vez que penso na subida ao Pico , orgulho-me de a ter conseguido sem qualquer tipo de preparaçao física e devo dizer que a montanha se entranhou em mim ou eu nela e todos os dias penso que vou ter de lá voltar e que hei-de subir o piquinho ! E agora já sei como o fazer. Primeiro , com calçado adequado ( é que eu sentia cada pedra que pisava e os dedos dos pés ficaram uma miséria ) . Segundo , devidamente preparada , tendo antes feito algumas caminhadas de aquecimento. Terceiro , com um grupo que queira subir a montanha descontraídamente , sem pressa de chegar ou de partir . Quarto e último , tenho de chegar lá acima a horas do por do sol , ficar por lá a dormir e só descer depois do nascer do sol.

Regressámos a São Roque onde nos reencontrámos com o Mário , depois de também ele ter tido um dia cheio de novas experiências ( até pescou um peixei rei para o gato do Roberto ! ).

E de volta a casa , o Pico continuava lindo :)

PS : Foi difícil seleccionar as fotografias deste dia que quero aqui deixar. Por muito que as tenha escolhido , continuam a ser imensas , começam com o nascer do sol e acabam com o por do sol. Estão dispostas pela ordem em que foram tiradas.


















































5 comentários:

wild disse...

As fotos são de cortar a respiração!! que paisagens fantásticas...

Keratina disse...

Grande mãe! Como sempre:cheia de genica!
Nem acredito que quando chegas é um logo um cigarrito!

PS- Deixei de fumar faz dois meses e estou aguentar-me!

Adoro caminhadas!

Beijokas

Pedro Gabriel disse...

Já somos dois a queres lá voltar.
Que fotos excelentes que aumentam a vontade ainda mais ;)

Mafas disse...

Subir o Pico é qualquer coisa de inexplicável. Adorei, mas no quando cheguei cá abaixo jurei que nunca mais. Prefiro contemplá-lo de outro modo ;)

Bjs,

Mafalda Figueiredo

Catarina Figueira disse...

Aninhas, o relato e as fotos deixaram-me com uma saudade imensa a apertar o peito. Saudade de ti, do Mário, da tua Mãe, do Pico... Quem sabe não voltaremos as duas a subir o Pico e pela primeira vez o Piquinho, mas desta vez juntas?!?!? Beijocas enormes e saudades sem fim, por minha culpa eu sei! Mas continuo a gostar muito de ti, ainda que nunca me desculpes.